“Você é uma mulher preta, feia e pobre!”, Albert (Danny Glover) dispara contra Celie (Whoopi Goldberg) em um dos muitos momentos em que A cor púrpura (The color purple, EUA, 1985), dirigido por Steven Spielberg, faz questão de dizer a que veio: expor histórias tipicamente humanas de dominação.
Mais do que o contexto das quatro primeiras décadas do século XX no sul dos Estados Unidos sugere, não é apenas o preconceito que envolve a submissão de negros por brancos que está em questão. Mesmo exclusivamente entre negros, o controle do mundo – ou dos pequenos mundos dos convívios particulares – parece subsistir na dominação da mulher pelo homem, do belo sobre o feio, do pobre em serviço do rico ou politicamente poderoso, do pai ou da autoridade moral semelhante sobre seus filhos, do colonizado diante do colonizador (nas cenas da África).
Celie consegue a proeza de encarnar todas essas submissões possíveis e sobreviver, apesar de uma vida cujas únicas características são o sofrimento e a esperança descrente da redenção, no reencontro com a irmã Nettie (Akosua Busia). A personagem de Whoopi encarna o conjunto humano que se submete, embora, na vida, exerça seus pequenos domínios e se vinga também naqueles tantos outros que, por um motivo ou outro, se encontram em posição inferior. Na realidade do mundo, poucos são os que são apenas dominadores ou apenas dominados na totalidade de suas relações.
No filme, como no mundo, despontam párias que assim são caracterizados justamente por tentar escapar à lógica da dominação, quando tinham tudo para prevalecerem ao lado dos submissos. Tanto Sofia (Oprah Winfrey) quanto Shug Avery (Margaret Avery) usam aquilo que lhes resta, a força bruta ou o apelo sexual, para sobreviver sem ter que se submeter, para encontrar um lugar novo no mundo que lhes pudesse ser menos sofrido, mas que, ao mesmo tempo, lhes impõe novos sofrimentos, uma vez que a estrutura de dominação social do sistema procura, sobretudo, punir aqueles que tentam escapar a suas garras.
Sofia e Shug, como Celie, sabem o que seria certo a fazer. Se não o fazem, é a percepção de seguir o caminho reto, ainda que certo, não lhes fará mais do que ovelhas do mesmo rebanho triste e doentio mantido sob o chicote da moralidade, do poder político e dos diversos tipos socialmente legítimos de comando. Não surpreende, pois, nesse clássico do cinema americano, que, depois de terem seguido a sua própria maneira um pouco torta o caminho que tinham à frente de si, Sofia e Shug, como Celie, não busquem outra coisa que não a redenção, amparada na compreensão do outro. Esta, porém, parece bem mais provável nas telas do que na vida.
Mais do que o contexto das quatro primeiras décadas do século XX no sul dos Estados Unidos sugere, não é apenas o preconceito que envolve a submissão de negros por brancos que está em questão. Mesmo exclusivamente entre negros, o controle do mundo – ou dos pequenos mundos dos convívios particulares – parece subsistir na dominação da mulher pelo homem, do belo sobre o feio, do pobre em serviço do rico ou politicamente poderoso, do pai ou da autoridade moral semelhante sobre seus filhos, do colonizado diante do colonizador (nas cenas da África).
Celie consegue a proeza de encarnar todas essas submissões possíveis e sobreviver, apesar de uma vida cujas únicas características são o sofrimento e a esperança descrente da redenção, no reencontro com a irmã Nettie (Akosua Busia). A personagem de Whoopi encarna o conjunto humano que se submete, embora, na vida, exerça seus pequenos domínios e se vinga também naqueles tantos outros que, por um motivo ou outro, se encontram em posição inferior. Na realidade do mundo, poucos são os que são apenas dominadores ou apenas dominados na totalidade de suas relações.
No filme, como no mundo, despontam párias que assim são caracterizados justamente por tentar escapar à lógica da dominação, quando tinham tudo para prevalecerem ao lado dos submissos. Tanto Sofia (Oprah Winfrey) quanto Shug Avery (Margaret Avery) usam aquilo que lhes resta, a força bruta ou o apelo sexual, para sobreviver sem ter que se submeter, para encontrar um lugar novo no mundo que lhes pudesse ser menos sofrido, mas que, ao mesmo tempo, lhes impõe novos sofrimentos, uma vez que a estrutura de dominação social do sistema procura, sobretudo, punir aqueles que tentam escapar a suas garras.
Sofia e Shug, como Celie, sabem o que seria certo a fazer. Se não o fazem, é a percepção de seguir o caminho reto, ainda que certo, não lhes fará mais do que ovelhas do mesmo rebanho triste e doentio mantido sob o chicote da moralidade, do poder político e dos diversos tipos socialmente legítimos de comando. Não surpreende, pois, nesse clássico do cinema americano, que, depois de terem seguido a sua própria maneira um pouco torta o caminho que tinham à frente de si, Sofia e Shug, como Celie, não busquem outra coisa que não a redenção, amparada na compreensão do outro. Esta, porém, parece bem mais provável nas telas do que na vida.
Shug Avery canta "Miss Celie's Blues"
Cena da redenção: "God is trying to tell you something"
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