A parte ocidental do mundo precisa abrir o olho!
Esta matéria do correspondente do jornal francês Le Monde em Pequim traçça um panorama bem atual da avidez chinesa por energia. Mais do que comprar empresas, antigas irmãs, gigantes do capitalismo ocidental, entretanto, a China tem investido, desde a virada do século, em campos de exploração e terras africanas. Ali, além de prospectar petróleo, dominam o cultivo da jatropha africana (vegetal que oferece melhor custo-benefício do que a cana-de-açúcar na produção de biocombustível) e de alimentos que vão abastacer seu bilhão e meio de consumidores.
Foi-se o tempo em que a África era considerada região de influência européia. Para ver o dominínio que a novíssima "colonização" chinesa tem exercido, basta examinar o mapa acima.
Do Le Monde
Brice Pedroletti, com tradução de Lana Lim
Há alguns meses os gigantes chineses da energia e dos recursos naturais são tomados por um novo frenesi de compras, alimentado pela crise financeira mundial e pela recuperação da economia chinesa, favorecida por um megaplano de retomada, que abriu todas as comportas de créditos.
Cerca de US$ 13,4 bilhões (R$ 25 bilhões) em contratos foram anunciados - mas não necessariamente confirmados - desde o início do ano somente no setor de hidrocarbonetos, segundo a consultoria britânica Dealogic, ou seja, 22% a mais do que há um ano. E isso sem contar a última operação em processo de discussão: a compra dos 84% da espanhola Repsol YPF dentro da YPF, a principal petroleira argentina, por US$ 17 bilhões, por uma dupla de petroleiras chinesas, a CNPC e a Cnooc.
O avanço das negociações, revelado pela agência de informações financeiras Dow Jones no fim de julho, ainda não foi alvo de comentários oficiais. No entanto o negócio está longe de ser concluído, apesar do endividamento da Repsol YPF: o governo argentino, que não tem parte na YPF, na verdade dispõe de um direito de veto. Em 2008, o governo espanhol já havia bloqueado a venda de 20% da Repsol YPF à russa Gazprom. E em fevereiro a chinesa Sinopec também havia tentado, em vão, adquirir 20% da Repsol YPF. Mas se a compra da YPF se concretizar, será o maior investimento chinês no exterior de todos os tempos.
Um sucesso chinês na Argentina poderia abrir uma porta que até agora manteve os chineses à distância de ativos muito "chamativos" por seu peso e pela carga patriótica que lhes é associada: em 2005 a Cnooc teve de retirar sua oferta de US$ 18,5 bilhões pela petroleira americana Unocal por causa de reações muito negativas que esse projeto suscitou nos Estados Unidos.
Mesmas dificuldades para a Chinalco, que teve de desistir, em junho, de dobrar sua participação na Rio Tinto, em grande parte por causa de considerações políticas: a gigante do alumínio chinês deve por enquanto se satisfazer com os 9% adquiridos, em fevereiro de 2008, por US$ 14 bilhões, da mineradora australiana.
Mas tudo caminha no sentindo de um maior papel dos chineses na corrida pelos ativos de energia e minérios através do mundo: ao mostrar a vulnerabilidade de seus investimentos financeiros em títulos do Tesouro americano, a crise financeira mundial tornou ainda mais atraentes os investimentos diretos no exterior para a reciclagem de cerca de US$ 2 trilhões de reservas monetárias chinesas. A energia e os recursos naturais, dos quais a China precisa em quantidades colossais, são alvos preferenciais.
Entrada na aristocracia
Por fim, os chineses reconhecem que seria bobagem não aproveitar um mercado favorável aos compradores. "A crise nos oferece oportunidades sem precedentes", declarou recentemente, ao "China Daily", um executivo da CNPC questionado sobre os negócios da petroleira chinesa, presente em 29 países.
A lista de aquisições ou de acordos assinados nos últimos meses pelas companhias chinesas mostra diversas mudanças, segundo os analistas. Apesar de os três grupos petroleiros, que são todos controlados afinal pelo Estado, terem competido muitas vezes uns com os outros no passado, eles não relutam mais em juntar forças: é o caso da oferta pela YPF, que reúne a CNPC e a Cnooc, especializada originalmente na exploração no exterior. Ou ainda, em julho, da compra pela Sinopec e pela Cnooc de um bloco em Angola da americana Marathon Oil, por US$ 1,3 bilhão.
Cada vez mais, as companhias chinesas se associam a parceiros estrangeiros, sinal de sua crescente aceitação pela aristocracia do petróleo: em junho, foi ao lado da BP que a CNPC conseguiu, disputando com a ExxonMobil, a exploração do campo petroleiro de Rumalia no Iraque. A Shell, por sua vez, entrou na disputa ao lado da Sinopec e da CNPC, por outro dos campos oferecidos, de Kirkuk.
Na Venezuela, a CNPC colabora com a Total para obter dois blocos petrolíferos e a construção de instalações para o tratamento de petróleo cru pesado. Os resultados da licitação, esperados para 14 de agosto, foram adiados.
Os grupos estrangeiros conseguem muitas vantagens com essa cooperação: eles aproveitam as capacidades de financiamento chinesas, economizam graças ao baixo custo da mão de obra, e esperam novos contratos na China.
A administração mais racional da política energética chinesa é o resultado direto do estabelecimento, em julho de 2008, de uma espécie de super-ministério da Energia, a National Energy Administration (NEA), ligada à Agência de Planejamento. Entretanto, segundo alguns analistas, Pequim às vezes paga um preço alto: a oferta da Sinopec pela suíça Addax Petroleum, de US$ 7,2 bilhões em junho, representava um bônus de 47% sobre a cotação da sociedade, bem mais do que o oferecido pelo seu concorrente coreano.
Publicado por Thyago Mathias
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