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segunda-feira, 8 de setembro de 2008

"Alienação e cultura: o ISEB", in Cultura brasileira e identidade nacional


(Apresentada à PUC-Rio, em maio de 2005)


Longe de consistir em um braço pensante do Ministério da Educação, o grupo de intelectuais que compunha o Instituto Superior de Estudos Brasileiros – ISEB formou um núcleo de pensamento da cultura pátria capaz de se distanciar da ideologia assumida em ações do Governo Kubitscheck. A essa idéia, apresentada no texto Alienação e cultura: o ISEB, Renato Ortiz soma uma detalhada descrição das fontes inspiradoras do grupo – o marxismo, a dialética hegeliana e o existencialismo de Sartre –, que uniram os conceitos de alienação e dominação colonial para conduzir à construção de um ideário nacionalista de cultura.


O que o núcleo formado por Roland Corbisier, Hélio Jaguaripe, Guerreiro Ramos, Nelson Werneck Sodré e Cândido Mendes, entre outros, pretendia era repensar o conceito de nação, revelando uma identidade própria que moldaria um rumo independente de desenvolvimento para o país. O contexto dessa linha teórica é o processo de descolonização afro-asiática, sobretudo a guerra de independência da Argélia, que foi acompanhada e serviu de base para o trabalho de Fanon, inspirador da idéia de que a tomada de consciência nacional só é possível com a ruptura do sistema colonial. Utilizando conceitos do próprio ISEB, pode-se dizer que a cultura brasileira, enquanto produto de uma sociedade colonizada, seria alienada e inautêntica, um “subproduto da cultura metropolitana”.


130 anos após o “grito de independência” do Brasil para com seu achador-colonizador, porém, quem seria a metrópole que se fazia refletir culturalmente nestas terras? O inimigo, nos tempos de JK, se encarnaria, certamente, no capital internacional que assumira o lugar de Portugal desde 1822. Nesse sentido, também não ajudava o controle social de uma elite que importava da Europa tudo o que pudesse ser considerado bom, a ponto de procurar transformar a capital do país em uma “Paris nos Trópicos”. É aí que o pensamento isebiano afasta-se ideologicamente das metas de desenvolvimento do Governo JK, sem, contudo, deixar de constituir-se em parte dele; residindo, nessa situação, uma dialética própria que serviria para reforçar a aura de liberdade e progresso histórico do período.


Enquanto Juscelino captava recursos com bancos estrangeiros e instalava, no país, multinacionais do automobilismo e da distribuição de combustível, o ISEB planejava uma “revolução”. O fortalecimento interno da economia, a auto-suficiência, a planificação e racionalização dos fatores de produção, bem como o desenvolvimento empreendido por meio da industrialização seriam as suas bases. Aqui se desfazem as contradições, porque se a postura internacional de JK era subserviente, ela o seria apenas o suficiente para lanças as bases de uma estrutura industrial que daria suporte à implantação do pensamento isebiano, irmão do ideário cepalino. Pelo menos teoricamente. Lembra-se que o próprio Marx via a ascensão do comunismo em uma Inglaterra industrializada, não em uma Rússia rural que não havia passado pela revolução mecanizadora.


Por mais, contudo, que o Brasil tenha crescido economicamente, durante a década de 50, tal progresso não se deu de forma compartilhada por toda a sociedade. O texto de Ortiz serve-nos como chave para compreender que nisso, talvez, o ISEB tenha falhado. E falhou, também, em substituir os símbolos do colonialismo internacional que se impunham na sociedade de consumo, impulsionada pelo welfare state de JK. Por mais que a antipropaganda de Décio Pignatari seja a prova de que a produção cultural do período tenha conseguido se firmar como um terceiro movimento modernista, capaz de expressar nossa nacionalidade de forma pontual, ela não impediu que uma simples Coca-Cola marcasse presença em nosso imaginário simbólico. Não, pelo menos, com o imediatismo esperado.


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